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No meu escritório: The Encyclopaedia of Motorsport

Hoje o conhecimento enciclopédico é pesquisável, mas não é servido com esta excelência.
Hugo Reis
10 de ago. de 2025

Parece parvo, até auto-destrutivo, que escolha escrever repetidamente acerca das vantagens do papel na cultura automóvel, num portal digital. Contudo, se há algo de que nunca me poderão acusar neste tema, é de incoerência. 

Sou, como qualquer um de vós, um ávido consumidor de conteúdos digitais automóveis, aos quais por vezes dedico horas em que deveria estar a dormir... ou a ler. O vídeo traz com ele os sons e ilustra fácil e rapidamente a dinâmica de um automóvel.

No entanto, nem a mais fantástica produção de vídeo me provoca o mesmo entusiasmo do que umas lombadas de uns livros ou revistas antigas, ou o pacote ainda fechado da Magneto, Tazio ou EVO, acabados de chegar

Se o digital é a auto-estrada para a informação, o papel é a estrada secundária, lenta, com uma paisagem incrível. Pode ser uma estrada tortuosa ou, se o texto for escrito por um genuíno artista das palavras, pode ser a mais bela e rica das experiências, com mais detalhe e mais expressividade do que o melhor dos vídeos

Mas esses livros e revistas em que os autores mostram porque são eles quem tem privilégio de guiar os mais exóticos automóveis, em vez do último modelo da BYD (há quem faça ambos, felizmente), estão relativamente a salvo. Esse é um produto que não pode ser substituído por um vídeo. No entanto, outros há, que caem forçosamente em desuso. 

Uma enciclopédia, sim.
“Já ninguém precisa de uma enciclopédia”, é o que todos pensamos. Se podemos pesquisar e encontrar imediatamente o que queremos, porquê perder tempo a folhear páginas sem fim? Porque não se trata de perder tempo, mas sim de nos perdermos entre imagens fantásticas e temas que nunca nos ocorreria pesquisar.

A Encyclopaedia of Motorsport chegou-me num lote de livros e anuários que comprei à distância a um entusiasta de Cascais que não cheguei a conhecer, mas que, definitivamente, não era da minha geração e que, provavelmente, não tinha entusiastas na descendência. A compra aconteceu entre gestos de um cavalheirismo e elegância que já não existem. Os livros foram entregues na Old Garage Cascais, do meu amigo Duarte Pinto Coelho, e chegaram a mim dias mais tarde, pelas mãos de outro amigo.

Em 1971, este livro editado pela Rainbird, custou sete libras. Hoje, ainda consegue encontrar-se à venda por pouco dinheiro o que, de certa forma, é uma tremenda injustiça. A ideia de ler uma enciclopédia, à partida, não parece muito cativante, mas depois vemos que são quase 650 páginas dedicadas a apenas três sub-temas. No final há ainda um interessante e relevante glossário, fundamentalmente técnico. 

Mas o que desperta efectivamente a curiosidade quanto a esta enciclopédia, é o calibre da lista de colaboradores, que inclui nomes como Denis Jenkinson, Doug Nye, John Davenport, Peter Hull ou David Hodges, entre outros, num total de 25 autores.

Muita história, sem precisar de wi-fi.
Esta enciclopédia está dividida por três áreas, sendo a primeira dedicada ao tema dos circuitos, provas de estrada, campeonatos e respectivos organizadores. Para cada um destes tópicos há uma contextualização histórica e uma breve descrição técnica e, quase todos são acompanhados por ilustrações ou fotos de época de grande qualidade e muito bem impressas. 

Existe, depois, uma secção denominada “Drivers”, que por ordem alfabética, nos entrega uma biografia de cada um dos grandes nomes do automobilismo até então, e também de alguns pilotos relativamente desconhecidos nesta parte do mundo.

A terceira grande secção chama-se, simplesmente, “Cars” e conta com 300 páginas. Aqui, surpreende o detalhe nas descrições de certas marcas relativamente desconhecidas: algumas extintas ou esquecidas, algumas fizeram apenas um modelo, muitas fizeram “kit-cars” de competição, mas todas elas tiveram presença na competição. Existem referências cruzadas com a história dos seus fundadores, equipas ou pilotos, anteriormente referidos. 

As fotos são, muitas delas, a cores e em grande formato (página completa) e são, sobretudo, abundantes. No prefácio, da autoria de Sir Stirling Moss, é-nos dito que esta obra conta com mais 1700 fotografias e mais de meio milhão de palavras. Sei que é uma afirmação arriscada, mas diria que algum do conhecimento desta enciclopédia, poderá não estar presente na internet mas, mesmo que esteja, isso não torna este livro menos desejável e rico.

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